Como já pudemos tratar em dezenas de estudos presentes em dois livros, “Ramatis, Sábio ou Pseudo-Sábio?” (1997) e “Espiritismo x Ramatisismo”(2010), o primeiro médium a afirmar receber comunicações advindas de um espírito chamado “Ramatis” foi Hercílio Maes nos anos de 1950, pegando carona em teses presentes em obras teosóficas e apresentando-as como novidades que deveriam os espíritas aceitar sem pestanejar, conforme expusemos em "Artigo Investigativo:Ramatis pode nem existir". Afinal, repetia-se ferozmente, já naquela época: “Kardec está ultrapassado”, “a Doutrina é progressista”, e algumas outras frases "chavões" sem qualquer consistência.
Depois do desencarne do médium paranaense, alguns outros médiuns, embalados pelo sucesso de vendas dos livros de Maes e, principalmente, pela aceitação do ramatisismo por parte de um considerável contingente de simpatizantes, em sua maioria constituída de neófitos no estudo da Doutrina Espírita, passaram a atribuir a Ramatis a autoria de ditados que, em muitos pontos importantes, contradisseram algumas das suas principais teses, principalmente aquelas já tidas como ultrapassadas e desmentidas pelos fatos e pelas Ciências, tais como as retumbantes previsões de catástrofes globais para o fim do século XX e as descrições equivocadas acerca da topografia do planeta Marte e do cotidiano de seus supostos habitantes. De modo a amenizar tais discrepâncias e escaparem de críticas e suspeições, alguns desses médiuns atribuíram tais inconsistências a uma suposta interferência anímica de Hercílio Maes.
Não obstante a avalanche de equívocos, contraditados pela Doutrina Espírita e pela Ciência, há quem insista ainda, nos dias atuais, em reviver e reeditar tais teorias sob uma fachada nova, intentando encontrar nas fileiras espíritas apoio e suporte à divulgação das mesmas.
O primeiro esforço articulado pelas lideranças do movimento ramatisista de modo atingir um maior número de leitores e angariar mais simpatizantes foi o de reeditar as obras de Ramatis através de uma editora com fins puramente comerciais, retirando da pequena "Livraria Freitas Bastos", do Rio de Janeiro, os direitos de exclusividade sob as obras de Hercílio Maes. A partir daí, coincidentemente ou não, surgiram de várias partes do Brasil novos autores apresentando-se como médiuns de Ramatis, cada qual apresentando a citada entidade espiritual com uma roupagem diferente e ainda mais exótica de modo a agradar aos mais variados gostos e tendências religiosas, tudo sob a fachada de um certo “universalismo” – na verdade, uma inglória tentativa de sincretizar o Espiritismo e, concomitantemente, facilitar a obtenção dos elevados lucros oriundos da vendagem de livros que de espíritas nada têm, apesar de assim se intitularem em suas respectivas fichas catalográficas.
Insistindo nos velhos argumentos
Em nosso artigo “Universalismo Crístico ou Misticismo Anti-Espirítico", alertamos para o exotismo das obras do médium Roger Bottini, do Rio Grande do Sul. Ao lermos e analisarmos um dos seus livros, intitulado "A Nova Era" (Editora do Conhecimento), deparamo-nos com textos atribuídos ao espírito Hermes, que se diz pertencente à falange de Ramatis. É o que parece ser, pois as teses anti-doutrinárias e as cincadas científicas estão lá, presentes. Citemos algumas delas:
1- Afirma o espírito Hermes: "A extinta Atlântida possuía conhecimentos superiores aos da atual humanidade"
Nosso comentário: Até hoje não há nenhuma prova concreta da existência dessa mitológica civilização. Caso tenha realmente existido, não faz sentido algum acreditar que ela tenha alcançado, 9.600 anos antes de Cristo, uma evolução intelecto-moral superior a de hoje. Caso isso fosse verdade, poderíamos perguntar onde estariam os aviões supersônicos, as naves espaciais, os computadores atlantes e o sem número de aparatos tecnológicos que temos hoje, advindos da evolução gradativa da inteligência humana ao longo dos séculos.
2- Em nota de rodapé, consta a antiga previsão de Ramatis sobre um suposto Presidente da República que se elegeria passando por cima de partidos e instituições e que "salvaria" o Brasil. Já tratamos deste assunto no artigo "Ramatis e o Presidente do Brasil". Primeiramente, segundo a nossa Carta Magna, a Constituição, só podem concorrer e eleger-se para cargos do Poder Executivo pessoas filiadas a partidos políticos. Em segundo, Ramatis "profetizou" a ascensão dessa figura ao poder em 1970, sendo que o espírito afirmou, à época, que o mesmo já teria percorrido mais da metade do caminho até a Presidência. No entanto, mais de 40 anos se passaram, e nada aconteceu.
3- Utilizando-se de um expediente surrado e vazio, o espírito Hermes ousadamente afirma que os "universalistas" são vítimas de perseguição e que aqueles que não concordam com suas propostas são obsidiados governados por "espíritos da Trevas" ou "magos negros": "Outra forma de atuação é fascinando os líderes religiosos para crerem-se os únicos detentores da verdade e, assim, lutarem contra seus irmãos no campo das ideias. Vemos claramente essa posição entre alguns encarnados que respondem pela própria Doutrina Espírita. Eles trabalham ferrenhamente contra o processo de união religiosa até mesmo com relação aos espíritas universalistas, seus irmãos de crença.Esses pobres fascinados rechaçam livros espíritas que contestam as suas posições dogmáticas, acreditando serem os donos exclusivos da verdade. Os espíritos das Trevas então realizam um trabalho de indução mental para que eles acreditem que seus irmãos, que pensam de forma mais abrangente e menos sectária, estão fascinados ou envolvidos por entidades maléficas, em uma total inversão do que realmente ocorre. O objetivo dos magos negros é sempre prejudicar os trabalhadores da Espiritualidade, os quais consideram seus "inimigos mortais". Logo, atividades que visem a prejudicar o trabalho de união das crenças religiosas, de conscientização para o período de transição planetária e do trabalho de esclare¬cimento para a Nova Era, são a meta principal desses irmãos ainda dominados pelas forças do mal".
Realmente já tratamos do tema no artigo "Nos Descaminhos da Fascinação". O leitor poderá ver quais são alguns dos sintomas desse tipo de obsessão, e certamente notará que indivíduos que creem na existência de crianças índigo, planeta chupão, apometria, poder curador de cristais e objetos materiais, profecias mirabolantes e aterrorizantes, intraterrestres, ETs que implantam chips em seres humanos, terapias exóticas e milagreiras, entre outras teorias esdrúxulas e sem qualquer respaldo, realmente só podem abrir brechas a espíritos galhofeiros e mistificadores que se esforçam em afastar o indivíduo da realidade, alienando-o e expondo-o a uma posição ridícula, levando de roldão a própria Doutrina Espírita perante a opinião pública.
Acredito que, ao invés de alegarem perseguição gratuita, deveriam os "universalistas" aceitar o debate e análise dessas teorias, pois só quem realmente considera-se "dono da verdade" se fecha ao debate e enfeza-se quando questionado. Ademais, jamais um espírito superior agiria de tal forma, pois, segundo nos ensina a Doutrina Espírita, "Os maus Espíritos temem o exame; eles dizem: 'Aceitai nossas palavras e não as julgueis.' Se tivessem a consciência de estar com a verdade, não temeriam a luz. O hábito de escrutar as menores palavras dos Espíritos, de pesar-lhes o valor, distancia forçosamente os Espíritos mal intencionados, que não vêm, então, perder inutilmente seu tempo, uma vez que se rejeite tudo o que é mau ou de origem suspeita. Mas quando se aceita cegamente tudo o que dizem, que se coloca, por assim dizer, de joelhos diante de sua pretensa sabedoria, fazem o que fariam os homens - disso abusam." (Allan Kardec, Escolhos dos Médiuns, Revista Espírita, fevereiro de 1859)
4- Insistindo na divulgação de mensagens atemorizantes sobre hecatombes causadas pela suposta aproximação de um astro intruso, o espírito Hermes corrige a data do "fim dos tempos". Enquanto Ramatis, nos anos de 1950, asseverou que o mundo não passaria do ano 2000 sem que dois terços da humanidade perecesse e a Terra fosse destruída por uma série de eventos catastróficos, o espírito Hermes, através de Roger Bottini, afirmou em 2002: "Esses períodos de transição abrangem em torno de cem anos do calendário terreno, sendo que o atual iniciou-se na segunda metade do século passado e deverá ser concluído até o final deste século". Vemos, daí, que como as previsões não se cumpriram, tratou-se logo de mudar as datas, empurrando-as para frente - bem típico das seitas apocalípticas.
5- Não satisfeito em demonizar os espíritas que não concordam com as ideias excêntricas que divulga, o espírito "universalista" Hermes não perdoa sequer uma grande personagem: Maria Madalena. Segundo ele, a discípula de Jesus, também conhecida como Maria de Magdala, teria sido usada pelo que os "universalistas" chamam de "Astral Inferior" e por "magos negros" - termos não aceitos e não constantes da Doutrina Espírita - para tentar seduzir e desvirtuar Jesus, com a intenção de "prejudicar os sagrados projetos do Alto".
Essa teoria não encontra respaldo nem nos textos bíblicos, nem em estudos sobre o Jesus histórico. Consta dos Evangelhos que Maria Madalena acreditava que Jesus Cristo realmente era o Messias. (Lucas 8:2; 11:26; Marcos 16:9). Madalena esteve presente na crucificação e no funeral de Cristo, juntamente com Maria de Nazaré e outras mulheres. (Mateus 27:56; Marcos 15:40; Lucas 23:49; João 19.25) (Mateus 27:61; Marcos 15.47; Lucas 23:55). No sábado após a crucificação, teria saído do Calvário rumo a Jerusalém com outros crentes para poder comprar certos perfumes, a fim de preparar o corpo de Cristo da forma como era de costume funerário. Teria permanecido na cidade durante todo o sábado, e no dia seguinte, de manhã muito cedo, "quando ainda estava escuro", foi ao sepulcro, achou-o vazio, e recebeu de um anjo a notícia de que Cristo havia ressuscitado e foi-lhe dito que devia informar tal fato aos apóstolos. (Mateus 28:1-10; Marcos 16:1-5,10,11; Lucas 24:1-10; João 20:1,2; compare com João 20:11-18). Em Lucas 8:2, faz-se menção, pela primeira vez, de "Maria, chamada Madalena, da qual saíram sete demônios". No entanto, não há qualquer fundamento bíblico para considerá-la como a prostituta arrependida dos pecados que pediu perdão a Cristo; também não há nenhuma menção de que tenha sido prostituta.Este episódio é frequentemente identificado com o relato de Lucas 7:36-50, ainda que não seja referido o nome da mulher em causa. Há, inclusive, "O Evangelho de Maria Madalena", que traz uma nova interpretação de quem teria sido Maria de Magdala. Segundo este evangelho, ela teria sido uma discípula de suma importância à qual Jesus teria confidenciado informações que não teria passado aos outros discípulos, sendo por isso questionada por Pedro e André. Ela surge ali como confidente de Jesus, alguém, portanto, mais próximo de Jesus do que os demais. Em trechos do citado evangelho, consta o que é um claro desmentido à tese dos "universalistas": "O apego à matéria gera uma paixão contra a natureza. É então que nasce a perturbação em todo o corpo; é por isso que eu vos digo: Estejais em harmonia… Se sois desregrados, inspirai-vos em representações de vossa verdadeira natureza. Que aquele que tem ouvidos para ouvir, ouça. Após ter dito aquilo, o Bem-aventurado saudou-os a todos dizendo: Paz a vós – que minha Paz seja gerada e se complete em vós! Velai para que ninguém vos engane dizendo: Ei-lo aqui. Ei-lo lá. Porque é em vosso interior que está o Filho do Homem; ide a Ele: aqueles que o procuram o encontram. Em marcha! Anunciai o Evangelho do Reino."
"Pedro disse: "O Salvador realmente falou com uma mulher sem nosso conhecimento? Devemos nos voltar e escutar essa mulher? Ele a preferiu a nós?". E Levi respondeu: "Pedro, você sempre foi precipitado. Agora te vejo lutando contra a mulher como a um adversário. Se o Salvador a tornou digna, quem és tu para rejeitá-la? Certamente o Salvador a conhece muito bem. Foi por isso a amou mais que ama a nós"."
6- Ainda incorrendo nos caminhos tortuosos das pseudorrevelações na tentativa de passar uma pretensa superioridade espiritual, o espírito Hermes, discípulo de Ramatis, afirma que "a velocidade da luz é entendida pelos cientistas humanos como o meio mais rápido de se viajar no espaço sideral. E eles estão corretos, dentro dos limites físicos". Em setembro de 2011, no entanto, foi descoberta a existência de partículas sub-atômicas (neutrinos) mais rápidas do que a luz.
7- Quando são citados trechos dos livros da Codificação Espírita, o desconhecimento parece ser ainda maior. O espírito Hermes, no capítulo XII, afirma que o espírito é criado "puro e ignorante", e não "simples e ignorante", o que é totalmente diferente. Mais adiante, diz que foi Kardec o criador da definição de "perispírito", enquanto que, na verdade, foram os Espíritos que a transmitiram a Kardec no item 93 de "O Livro dos Espíritos". Aliás, esse é um erro comum por parte dos "universalistas", que para reforçarem a tese de que o Espiritismo estaria ultrapassado, geralmente imputam ao Codificador a autoria dos ensinamentos, e não aos Espíritos Superiores que, de fato, responderam aos questionamentos elaborados pelo professor francês.
Prosseguiremos, em novos artigos, a analisar as proposições "universalistas" à luz do Espiritismo. Aguardem.